Por pertinente, publica-se aqui o último comunicado do MCLT.
O MCLT – Movimento Cívico pela Linha do Tua, vem manifestar-se totalmente chocado com a série de eventos que ocorreram desde o passado dia 9 de Julho até hoje, relacionados com a Linha do Tua. Manifestamo-nos com grande pesar, pela evidência do desaparecimento de qualquer sentido de ética, de dever nacional e de respeito pelos princípios básicos da democracia, consagrados na Constituição da República Portuguesa, por parte de alguns intervenientes.
A impressionante sucessão de disparates proferidos pelo Ministro e pelo Secretário de Estado dos Transportes na comissão parlamentar sobre a Linha do Tua do passado dia 9 foi de um tal grau de ofensa e de manifesto desprezo por esta via-férrea e pelos trasmontanos, que a consideramos abusiva e reveladora da total disparidade deste Ministério ser representado por duas figuras tão indignas e hostis para Trás-os-Montes. Foi manifesta não só a incompetência, já demonstrada anteriormente pelo Secretário de Estado sobre a Linha do Corgo, mas também o grosseirismo. Como tal, o MCLT exige a DEMISSÃO imediata do Ministro António Mendonça, e do Secretário de Estado Carlos Fonseca, aproveitando para clarificar algumas das falsidades por si proferidas e sustentadas:
1 - Se cada utente da Linha do Tua custasse ao Estado 29 mil euros por ano, e mesmo considerando uma procura média da Linha do Tua de 40 mil passageiros por ano (asfixiada graças à negligência da tutela, CP, REFER, e entidades de promoção turística), teríamos que a Linha do Tua custaria 1.160 milhões de euros por ano (300 milhões de euros menos do que custará o troço do TGV entre Poceirão e o Caia, e 500 milhões de euros a mais que os custos da CP durante 2009). Ora, sabendo que o Metro de Mirandela precisará de cerca de 30 mil euros por mês para honrar os seus compromissos, e considerando uma verba para conservação da linha em 250 mil euros por ano, a verba apontada como custo pelo Ministro daria para suportar a operação da Linha do Tua durante… mil e novecentos anos.
Lembramos ainda que a Linha do Tua foi, talvez e apenas a par de alguns serviços suburbanos e do Pendular, a única linha portuguesa onde a oferta era claramente inferior à procura; não precisamos lembrar os tristes episódios de excursões que não embarcaram na estação do Tua por falta de lugares, as dezenas de circulações que se efectuaram com a lotação esgotada, ou mesmo o episódio em que D. Duarte Pio não embarcou no comboio por falta de lugar e não ter sido dada autorização para engatar outra automotora, que estava totalmente disponível.
Solicitamos também informação sobre qual o prémio a atribuir às populações do Oeste para desistirem de vez do comboio, uma vez que tendo comboios a sair e a chegar de estações tão periféricas como o Oriente ou Entrecampos-Poente, pudemos observar que à passagem pela estação de Agualva-Cacém estes transportam 5 ou 6 passageiros, diariamente. Opção: feche-se, ou renove-se e promova-se a Linha do Oeste, numa região considerada prioritária pelo PENT?
2 - Com 40 milhões de euros reabre-se a Linha do Tua entre o Tua e o Cachão; com 25 milhões de euros reabre-se a Linha do Tua entre a Brunheda e o Cachão; com 150 milhões de euros reabre-se a Linha do Tua do Tua a Bragança, com material de via melhor que o actual. A estação de Castanheira do Ribatejo custou 35 milhões de euros; o Estádio de Aveiro custou 62 milhões de euros; semelhanças: ambos estão às moscas. Voltamos a insistir: mesmo que a barragem do Tua seja feita, o espelho de água não chegará à Brunheda; porque continuam então os comboios confinados ao troço Mirandela – Cachão, que tantos prejuízos está a causar aos utentes, ao Metro de Mirandela, e à região?
3 - O EIA da Barragem do Tua afirma (e o MCLT já está cansado de o apontar): a zona envolvente não apresenta condições propícias ao transporte rodoviário de passageiros. Porque se continua a insistir no erro de tentar substituir a Linha do Tua com autocarros e as exasperantes estradas da região? Será que o Ministro e o Secretário de Estado as conhecem? Será que sabem que no troço encerrado entre Mirandela e Bragança os autocarros de substituição só duraram 5 anos, e custaram 90.000 passageiros à Linha do Tua, tendo registado acidentes com vítimas mortais e vários feridos?
4 - Como ficou bem demonstrado pelo professor da UTAD Rui Cortes – um dos intervenientes na execução do EIA da Barragem do Tua – no passado sábado num debate no Museu do Douro sobre a Barragem do Tua, “A ideia idílica de ter uma grande massa de água não se vai verificar. Pelo contrário, será uma situação muito desagradável com grandes variações de cota que não são propícias para fins turísticos”, proporcionando “um grande efeito de erosão e uma perda absoluta do solo em redor”, e afirmando ainda que “as emissões de gases de efeito de estufa a partir das grandes albufeiras representam cerca de quatro por cento do total de emissões a nível mundial”. São duas bandeiras da Barragem do Tua que, já mal sustentadas, caem de vez por terra, demonstrando uma vez mais não apenas a sua inutilidade como o seu poder destrutivo ambiental e do desenvolvimento económico-social.
5 - “Há uma dinâmica territorial que tem levado as pessoas para o Litoral”; “não é por criarmos oferta de transportes que se fixa as pessoas”, como o demonstra “a experiência mundial”; palavras do Secretário de Estado dos Transportes. De facto, nenhum trasmontano gosta da sua terra, e prefere mil vezes fugir para Lisboa a 400 ou 500Km de casa e enfrentar todos os problemas sociais derivados da sobrepopulação do território, a que lhe sejam garantidas condições de habitabilidade sem migrar para longe. Solicitamos ao senhor Secretário de Estado que, antes de abandonar as suas funções, o que fará imediatamente se tiver vergonha na cara, demonstre aos portugueses exactamente qual experiência mundial suporta que a criação de oferta de transportes não é uma condição de suma importância para a fixação das pessoas numa região.
A solução unimodal é apenas uma senhor Ministro: a Linha do Tua reaberta, modernizada e prolongada, do Tua a Bragança e ao Lago da Sanábria. As evidências apontam para isso, e é preciso ser cego, ou demagogo e motivado por interesses mesquinhos e danosos para o negar.
Perguntamos ainda aos senhores Ministros dos Transportes, do Ambiente (Portugal tem tido Ministério do Ambiente desde 2005?) e da Cultura, se sabiam destes factos. Agora que sabem, endereçamos-lhes uma pergunta muito simples: o que vão fazer a partir de agora, se é que têm competência para o saber fazer, porque de “nins” ou artifícios não reza a História do Desenvolvimento.
Mas como a falta de ética e sentido de realidade e respeito não é patente apenas no Ministério dos Transportes, foi hoje noticiado que a EDP, em pleno ano internacional da biodiversidade, propôs a criação de um parque natural que englobe a área das barragens do Baixo Sabor e de Foz Tua. Uma empresa que está obstinadamente apostada em destruir dois vales praticamente intocados, plenos de biodiversidade e valor paisagístico, a propor a criação de parques naturais, é de um mau gosto demagógico inqualificável. Pedimos também um esclarecimento sobre qual dos dois está claramente a mentir: se o senhor Ferreira da Costa, administrador da EDP Produção, ao dizer que a Associação de Municípios do Baixo Sabor deu o seu aval à criação de um parque no vale do Sabor, ou o senhor Aires Ferreira, autarca de Moncorvo e presidente da Associação de Municípios do Baixo Sabor, ao classificar este parque como “uma ideia que não tem pés nem cabeça”; a confusão é evidente.
Numa nota solta, lamentamos a desfaçatez do autarca moncorvense: é de facto notável que quem apoie a construção da megalómana barragem do Sabor se apresente agora com moralismos atestando que “A biodiversidade do Sabor é muto mais interessante do que a do Tua”. De facto, em política em Portugal, tudo é possível.
Manifestamo-nos portanto totalmente contra esta brincadeira de mal gosto, de quem vem para Trás-os-Montes destruir património e biodiversidade, e avança com propostas de parques naturais e núcleos museológicos, como se uma mão lavasse a outra.
A nossa proposta para a EDP é muito simples: se quer compensar os trasmontanos por perdas, pode começar a fazê-lo por cada grande barragem já construída, ao reforçar a potência instalada, e prevenindo desperdícios de caudal, e baixando a tarifa da electricidade na região que mais contribui com energia hidroeléctrica para Portugal. Se a sua vontade inabalável em trazer desenvolvimento se mantiver, pode também contribuir generosamente com os seus chorudos lucros e ordenados dourados para a reabertura, modernização e prolongamento da Linha do Tua. Construir a barragem do Tua, não.
Mirandela, 21 de Julho de 2010.
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MCLT - Movimento Cívico pela Linha do Tua
http://www.linhadotua.net
Apostila: Há dias foi notícia a proposta da companhia das índias interiores (leia-se EDP) em passar a pagar a derrama sobre o IRC nos municípios onde estão construídas as barragens e não em Lisboa onde se localiza a sua sede. A capacidade da EDP em oferecer o que não lhe pertence é fascinante. A derrama é algo inevitável e por lei pertencente aos municípios, logo à EDP tanto lhe faz pagar em Lisboa ou em Mirandela. Com esta habilidade a EDP pretende fazer-se passar por benemérita sem gastar um centavo. Mas a justiça não passa por aí. Para começar, a EDP deveria ter a sua sede social não em Lisboa mas sim numa cidade da região onde tem as suas instalações produtivas mais rentáveis, e.g., Vila Real, Bragança, Braga, Ponte de Lima, etc.; para finalizar, deveria pagar um prémio, previamente contratualizado, pela utilização do potencial hidroeléctrico de cada região, que comportaria uma parte fixa (um aluguer) e uma parte indexada aos lucros obtidos com a energia produzida em cada município. Esta é a única solução aceitável, justa e não colonial.
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